Pais, Filhos e Educação Cristã
Você tem a responsabilidade de criar seu filho, sabia? Parece óbvio. Mas e se afirmarmos que o processo educacional de seu filho também é tarefa sua? Na realidade o processo educacional é mais uma extensão do “criar filhos” e isto é de sua total responsabilidade. Para aqueles que franziram a testa recomendo que continuem lendo. O objetivo deste texto é esclarecer o porquê da educação cristã e a responsabilidade dos pais de educar.
De quem são os filhos?
De início faço a seguinte afirmação: Os filhos não são seus! Em termos criacionais e redentivos todos nós pertencemos ao Senhor uma vez que fomos criados por Ele e comprados pelo sacrifício vicário de Cristo. Nossos filhos não estão excluídos desta verdade. Vemos esta realidade em destaque, quando Deus requereu do Antigo Israel a morte de seus filhos nos tempos do profeta Ezequiel:
“Mataste a meus filhos e os entregaste a elas como oferta pelo fogo.” (Ezequiel 16.21 – grifo meu).
Como Soberano Criador e Redentor, Ele confia aos pais o papel de educar os filhos na admoestação do Senhor:
“E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor.” (Ef 6.4).
No período veterotestamentário, o povo de Deus foi encarregado de disseminar para as gerações futuras a confissão de fé do Shema: “Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor”, bem como todos os estatutos e mandamentos. O meio pelo qual o Senhor designou para a disseminação de tal conhecimento era o ensino. O pai era comissionado a ensinar seus filhos sobre o axioma do Shema todo o tempo, “assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te. Também as atarás como sinal na tua mão, e te serão por frontal entre os olhos. E as escreverás nos umbrais de tua casa e nas tuas portas” (Dt 6.7b-9). Isso implica que o assunto da casa deveria ser Deus, os pais deveriam inculcar (Dt 6.7) às palavras do Senhor aos seus filhos, e os filhos, aos filhos dos filhos, assim sucessivamente, o nome do Senhor seria levado pelas gerações.
Um pouco a frente, ainda no capítulo 6, vemos o que poderia ser entendido como um estudo de caso de uma ação pedagógica dentro da perspectiva redentiva:
“Quando teu filho, no futuro, te perguntar, dizendo: Que significam os testemunhos, e estatutos, e juízos que o Senhor, nosso Deus, vos ordenou? Então, dirás a teu filho: Éramos servos de Faraó, no Egito; porém o Senhor de lá nos tirou com poderosa mão” (Dt 6.20-21).
O verso segue com a narrativa descritiva dos atos do Senhor para com o povo no Egito. A resposta do pai ao filho faz um apelo a conjuntura histórica, o filho foi educado sobre como a história se desenrolou com e a partir da intervenção do Senhor (e pode ser entendida aqui como a área de estudo também).
Como propus há pouco, este é um estudo de caso que aponta para aquilo que podemos chamar de ensino integral, a educação que engloba as áreas do conhecimento a partir de Deus, a saber, educação cristã, ou no âmbito escolar, como enfatiza Solano Portela, educação cristã escolar. Destaco aqui que o objetivo deste texto é tão somente focar na responsabilidade dos pais na educação dos filhos, por isso não darei ênfase ao prisma escolar da questão, embora esteja diretamente relacionada com a responsabilidade paterna.
O que estão ensinando aos nossos filhos?
Ainda em menção ao Presbítero Solano Portela, o título desta seção é mais um motivo pelo qual você deveria se ater a educação de seu filho.
Como destaquei no estudo de caso em Deuteronômio, somos ensinados a ensinar a partir das situações cotidianas (seja em instrução formal ou informal) sobre o Senhor, em outras palavras, a educação deveria ser um subproduto de um coração do qual o pressuposto primário é o Senhor. Tal verdade explicita um fato que deveria chamar nossas atenções: O homem NÃO tem a capacidade de ensinar sem pressupostos.
A herança do Iluminismo que prega a razão neutra culminando na neutralidade da pesquisa, na realidade é um mito. Neste quesito não poderei me deter, mas para um entendimento geral da questão, indico a leitura do livro “Crítica da Razão Pura” de Immanuel Kant. Em linhas gerais, ao responder empiristas e racionalistas, o autor alemão desenvolve a relação necessária entre experiência e conhecimento puro (conhecimentos a priori e posteriori). Postuladas estas ideias, a filosofia, de modo geral, passou a rejeitar vertentes que concebessem a ideia de conhecimentos desenvolvidos através do pressuposto da neutralidade do pensar.
Porque isto nos interessa? Ora, se crermos que o homem não tem a capacidade de desenvolver pensamentos a parte de outras áreas da vida que o impactam, logo, todos os desdobramentos que ocorrem a partir do raciocínio humano e sua interpretação de mundo estão atrelados e diretamente relacionados aos pressupostos que os antecedem.
Isso levanta uma questão que é muito pertinente ao tema deste texto. Uma vez que o homem pensa o mundo através de pressupostos, deveríamos nos questionar o que está por trás daqueles que pensaram a educação que chega até nós, simplificando, o que estão ensinando aos nossos filhos?
O Estado, que hoje detém a maior parte das escolas e consequentemente da educação em nosso país, arroga para si o adjetivo “laico”, e isso é bom, porém nunca poderá ser desprovido de sentimento religioso. Se pensarmos nos pressupostos da mente humana para raciocinar e interpretar o mundo, podemos apontar a religião como sendo um pressuposto fundamental. Embora vivamos em uma sociedade onde muitos se identificam como ateus, todos nós somos seres religiosos quando pensamos que a religião não se baseia no objeto de devoção, mas sim na relação de indivíduo e objeto, sendo este objeto transcendental ou não.
O que resulta disto são pessoas movidas pelos mais diferentes pressupostos (ou deuses, como queira). E, por isso mesmo, nem sempre refletirão os valores cristãos em sua educação
Diante desta realidade, vemos muitos dos diversos “métodos pedagógicos”, como o construtivismo, sendo amplamente praticados nas escolas seculares, tornando-seum meio de doutrinação. Não é sem motivo que regimes totalitários tendem a exercer controle absoluto sobre a educação, como foi no caso dos regimes comunistas da Europa Oriental que reeducavam crianças em instalações gerenciadas pelo governo.
Estes últimos fatos não são em si o objeto de maior importância para a necessidade da educação cristã, mas certamente são perigos diante da lacuna que temos deixado como pais e como Igreja.
Mandato Cultural
Analisamos até aqui como a responsabilidade de criar filhos está diretamente relacionada ao processo educacional da criança. Igualmente necessário é o cumprimento daquilo que é conhecido na teologia como Mandato Cultural. Em Gênesis 1:27-28, o Senhor diz:
“Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra”.
Deus nos comissiona a dominarmos sobre a Criação sujeitando-a. Parte necessária de sujeitarmos a criação é entendê-la em suas diversas facetas por meio de estudo e pesquisa. Diversos vultos ao longo da história do Cristianismo entenderam a importância da Educação Cristã, como Robert Raikes que lecionava aulas de alfabetização na Escola Dominical, o resultado foi tão impactante que as taxas de criminalidade caíram em Gloucester (cidade de Raikes), sendo que a Escola Dominical, mais tarde se tornou uma divisão de ensino da Igreja. Podemos citar também Calvino com a fundação da Academia de Genebra, Abraham Kuyper, Charles Hodge e tantos outros que se empenharam em estudar o tema da Educação Cristã.
A Igreja ao longo da história tem fundado Escolas Cristãs que partem destas premissas através de pais comprometidos com o ensino integral de seus filhos. O correto entendimento da responsabilidade dos pais na educação dos filhos aponta para o reinado do Senhor sobre todo o cosmos. Seu domínio transcende o material e o imaterial, o imanente e o inerente, Ele reina sobre todas as coisas e nosso dever como servos que somos é de trabalharmos pela sujeição criacional, parte deste cumprimento é discipularmos integralmente filhos que possam ser, como nas palavras do Salmista, flechas nas mãos do valente (cf.Sl 127.4).
Bruno Philippe
Editor e Gestor de Conteúdo do Ministério LER.